Recentemente eu li um texto sobre a relação das mulheres com o trabalho realizado no ambiente profissional e o motivo delas não se destacarem tanto quanto deveriam. Uma das coisas que o texto destaca é que elas falam de sua atuação como uma ajuda e não como uma participação de verdade, um trabalho em si.
O texto começa com um exemplo ligado ao jornalismo, falando que os homens, quando estão editando um texto de outra pessoa estão trabalhando, já as mulheres, estão só dando uma ajudinha.
A partir deste ponto eu refleti que a coisa da ajuda é tóxica, muito tóxica na nossa vida.
Eu, uma ajudadora profissional.
Dizem que, no geral, mulheres são ensinadas a ajudar sempre. Não posso dizer por todas, mas posso falar por mim. Não importa a qual hora do dia ou da noite, se alguém pergunta como faz um pudim, uma barra em uma calça, uma dúvida de matemática ou como fazer uma campanha no Facebook.
Mas é sempre ajuda. Uma trabalho não remunerado, cansativo, não reconhecido. Meses depois alguém fala do sucesso com uma campanha, do novo emprego em uma empresa foda, de como todos elogiam o pudim, mostra um livro com ideias que você já viu em algum lugar e pra mim só resta o cansaço.
Pois é, amo ajudar meus amigos. Mas caio no erro ridículo de deixar minhas prioridade de lado para fazer isso. Eles crescem, avançam e eu fico aqui atrás. Minha terapeuta falou na dificuldade em falar não. Estou trabalhando nisso, mas é tão difícil e vou explicar os motivos:
- Aprendi que devo sempre ajudar os outros. Criação cristã, entende? Quem pede ajuda é menos afortunado, está precisando e eu tenho certa obrigação. Sei que não, mas funciona assim na minha cabeça.
- Saio respondendo no automático. Se eu sei uma resposta, ela me escapa, toma vida própria e vai indo. Só que ela pode ser longa e tomar bastante tempo.
- Vontade de agradar. Fico me sentindo péssima se sei que alguém está chateado comigo, o que faz de mim uma pessoa ótima para cair em chantagens emocionais. Até meus gatos sabem disso.
- Medo de desapontar minha mãe. Sim, minha mãe sempre deu conta de um tudo e se eu não conseguir acho que vou deixar ela desapontada.
Acho que em síntese é isso, mas quando eu tento sair do ciclo a coisa complica. Minha mãe já falou para eu não ficar presa nisso, mas de que adianta?
As pessoas que estão acostumadas a ter as respostas instantaneamente de mim não gostam muito quando falo que não vou poder ajudar agora. Nem sempre consigo lidar com isso.
Quem ajuda os ajudadores?
Por outro lado, com essa obrigação de ter resposta para tudo, de estar sempre à disposição, de saber sorrir e acenar por pior que as coisas estejam, não sobra espaço para pedir ajuda. E não existe quem veja a necessidade de ajudar.
Pelo menos não até um ataque de pânico. Um burnout. Uma enxaqueca. Até o corpo te parar sem chance de você ignorar o chamado.
Às vezes no primeiro sintoma você aprende, às vezes os sintomas vão se acumulando. Não falo só por mim, vejo isso acontecer com tanta gente conhecida que se começasse a descrever uma situação comum várias meninas iam achar que estava falando de alguma delas em particular.
Mas não. Vagamos por aí, umas mais e outras menos, com nossos sintomas, dores e o que for. A gente é ensinada a ajudar sem pedir ajuda, porque a gente não pode atrapalhar.
A ajudinha dos homens. Outra fronteira.
A divisão de tarefas é uma coisa maravilhosa. A casa pode ser dos dois, o filhos pode ser dos dois, mas o homem só ajuda. Os dois trabalham fora, mas a obrigação de pensar, planejar, executar é só da mulher? Como isso pode estar certo?
É cultural, sabemos, mas não está certo. E mesmo um homem muito participante, que faz muito do serviço em casa, se ele ajuda muito, tá errado. Porque se ele ajuda, quem tá pensando em tudo é a mulher, e essa parte de pensar é muito desgastante.
E vamos entrar em um acordo, o homem que ajuda muito é raro. A maioria tira o lixo depois de bastante discussão, lava a louça às vezes e é isso. Pequenas variações do tema.
Ah, mas o salário dele é maior.
Sim, o salário do homem muitas vezes é maior mesmo. Porque os homens em uma mesma posição, com a mesma escolaridade e entregando a mesma qualidade de trabalho ganham 30% a mais que as mulheres.
Eles não são perguntados se irão engravidar. Não sofrem assédio sexual o tempo todo e são coagidos a pedir demissão em vez de denunciar o assediador. Eles são criados para serem vencedores enquanto nós somos as boazinhas que sorrimos e agradamos. Eles fazem e acontecem e nós só ajudamos com as contas da casa, mesmo se a nossa produção for tão boa quanto.
Enfim.
Os homens também perdem com isso, claro. Mas aí é tema para outro texto, outra reflexão.