Quando a saudade aperta

Gabi
2 min readFeb 16, 2021

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Uma foto nem sempre é só uma foto

Outra noite minha mãe me encaminhou uma foto que parece ter sido tirada em outra vida. Eu, meu irmão, dois primos e um tio em uma piscina. Sei que todas as crianças da foto sentem falta do meu tio.

Foto de Inga Seliverstova no Pexels

Chamava todo mundo de bundão, falava alto pra caramba, foi quem fez marcação cerrada em cima do meu marido quando ele foi apresentado pra família. Dava presentes em datas aleatórias e cozinhava bem. Lembro de estar em casa e ele chegar com uma travessa de kibe frito na hora, com bastante gosto de hortelã e fatias de limão.

No dia do aniversário dele, sempre dava flores pra minha vó, em agradecimento por ter nascido (ou coisa do tipo). Lembro de assistir as Olimpíadas com ele, as de verão e as de inverno. Não sei o que ele falaria de um ano em que nem teve jogos.

Ele era bravo, às vezes ficava muito vermelho. Quando exagerava na bebida, não era muito legal de ver. Felizmente, não foi o que mais marcou, apesar de eu lembrar de um dia em que se quebraram pratos nos chão como se a família fosse grega — não é.

Referências

Sinto falta dos tios que eram próximos. Esse tio, o da foto que falei, me dava papel de carta, coisas enfeitadas e delicadas. Acho que era a pessoa que mais me tratava como uma garotinha delicada.

Achava o máximo eu gostar de Beatles e contava para isso para todos. Também chamava para escutar os CDs novos que comprava. Antes de construir a piscina, improvisou umas caixas d’água pra gente não ficar com tanto calor.

Lembro que ele bebia leite puro, e eu achava isso muito legal. Por um tempo copiei, depois voltei pro Nescau. Também lembro que sempre tinha uísque na sua casa — Anos 80, Passport. Lembro do quadro de nós de marinheiro e da estante com uma corda que caia do teto.

Hoje, quando estou com algum problema, se sonho com ele, acordo com a certeza de que vai ficar tudo bem. Com ele ou com minha vó, minha madrinha ou mais uma tia. Acho que é a forma de eu não ter tanta saudades assim.

Violência

Uma parte difícil de aceitar sua morte, é que ela foi morte matada, depois que ele tinha superado um enfarto e não bebia mais. Morreu trabalhando, por motivo besta. Agente de trânsito, foi assassinado junto com o colega porque aplicaram multas em pessoas que tinham estacionado em local proibido.

O assassino, um comerciante local, achava que as multas iam afugentar os turistas, foi julgado, condenado e preso, mas já está em liberdade. Mesmo depois de quase 20 anos, a gente não consegue lidar com a situação.

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A gente escreve o que não entende para entender o que não se escreve.

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