Buckingham

Quando seu gosto apurado não combina com sua conta bancária

Gabi
4 min readJul 31, 2024

Eu nunca fui uma criança que acreditou em figuras folclóricas como Papai Noel ou Fada do Dente. Isso não significa que tenha sido alguém que não acredite em magia, só que eu acreditei em feitiços diferentes.

Digo isso porque acreditei que o trabalho duro me faria ter tranquilidade financeira. Estudei, trabalhei, fui posta de lado e hoje estou caindo na real: tranquilidade financeira é para poucos. Não se preocupar com dinheiro é para privilegiados e algumas raras excessões.

Apesar de estar desiludida, não consigo deixar de gostar das coisas que gosto. Continuo querendo conhecer o mundo, apreciar arte, fazer massagens, comer chocolate de verdade e tomar chás incríveis. Usar perfumes que despertem emoções ao invés de abafar os sentidos com o excesso de notas açucaradas e usar uma maquiagem que deixe a pele linda.

Eu gosto de qualidade

Desde pequena eu tive a impressão de que seria capaz de escolher o item mais caro em um local — só por ser o que eu mais gostasse. Basta eu me encantar por ele e aí a gente sabe que é caro. Quase nunca falha.

Uma época minha mãe falava que era pra eu ter nascido no Palácio de Buckingham, mas aí erraram a entrega e eu fui parar em Caraguatatuba. Claro que parte da impressão vem da minha necessidade de silêncio, gosto por coisas bonitas e harmoniosas. Coisas que provavelmente têm mais relação com minhas neurodivergências que com ser chique. Se sentir excluída o tempo todo não tem nada de chique.

Será que me falta brasilidade?

Não sei sambar e não tenho time de futebol. Falo baixo (apesar de gargalhar alto às vezes) e não sou apaixonada por feijoada (como, mas não é minha primeira escolha). Confesso que às vezes gostaria de ser mais tipicamente brasileira. Ter um monte de alegria e saber sambar. Fazer parte de uma torcida, pertencer a um grupo. Mas vivo com enxaqueca e não posso me dar o direito de ser tão animada.

Sempre preciso pensar antes de fazer qualquer coisa. Claro que muita gente acha que essas restrições são escolhas. Infelizmente não, é bastante dor e um pouco de neurodiversidade.

Enquanto tento me manter acordada, mas estou passando mal sem saber se é pressão, começo de gripe ou alguma coisa psicológica, sinto que não me encaixo, não tenho essa facilidade em pertencer. Tenho sono. Pena que na hora de dormir ele vai embora. Estou indecisa se sinto dor, sono, tontura, tudo ou outra coisa. Pensar em deitar e dormir profundamente é o que me move, mas não dá.

Cabelo

Outro sinal de falta de brasilidade é que não faço questão do cabelo comprido. Não que eu não goste, só não combina comigo. Além disso, gosto de experimentar, mudar. Então nunca fui pessoa de ficar chateada porque cortou mais de dois dedinhos ou porque a franja ficou ligeiramente torta. Cabelo cresce.

Eu sempre tive muito cabelo, de até os cabeleireiros comentarem. Talvez por isso, quando comecei a perceber que tava caindo muito, ninguém levou a sério. É impressão. Pois bem, chegou um momento em que a dermatologista concordou que não era impressão.

Diz ela que tenho afinamento capilar e me passou um remédio pra eu passar todas as noites. Pois bem comecei no sábado. Domingo acordei com dor de cabeça. Segunda também. Na terça passei mal o dia todo e decidi que não passaria o remédio à noite para ver se é isso mesmo. Na quarta, hoje, acordei sem dor.

O remédio receitado pela médica pode fazer mal para animais de estimação. Eles seriam mais sensíveis aos efeitos vasodilatadores, podendo ter problemas cardíacos. Minha pressão é naturalmente mais alta, de modo que na minha cabeça, mesmo se o medicamento tivesse algum efeito, não seria problema.

Só que tenho enxaqueca e aí qualquer coisa que afete o couro cabeludo tem potencial para causar dor. E causou. E a enxaqueca forte causa ânsia e mal estar. A dúvida agora é se sou muito sensível aos componentes do medicamento ou se estou com problema de saúde mais sério.

Já tinha ficado chateada quando a médica falou do afinamento. Agora estou mais preocupada se vou morrer do coração. Dramático? Sim. Mas até o médico falar que tudo bem, eu vou tomar cuidado e buscar outro tratamento pro tal do afinamento. Espero que exista.

Apesar de não fazer questão do cabelo longo, gosto que esteja bonito e estiloso. Enfim, vamos ver no que dá. Fosse eu rica, já estaria tudo solucionado. Alimentação equilibrada, exercícios e pacote completo. Como não nasci na realeza, vou ter que ir aos poucos resolvendo isso, como meros mortais.

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Gabi

A gente escreve o que não entende para entender o que não se escreve.